sábado, 8 de agosto de 2015

A CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE NOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

Colaborador Roberto Rocha

            Biodiversidade é um termo que vem ganhando grande repercussão nos últimos anos. Esse fato decorre da preocupação mundial, cada vez maior, em garantir recursos naturais básicos para as gerações futuras. Estima-se que até o final do século XXI o planeta perderá grande parte de sua riqueza biótica, o que representa séria ameaça econômica. Plantas e animais são recursos renováveis desde que mantenham suas populações geneticamente viáveis. A polinização das flores e a dispersão de sementes, por exemplo, são fenômenos naturais em grande parte envolvendo animais invertebrados e vertebrados de diversas espécies, garantindo assim a sobrevivência das florestas. No entanto esse "reflorestamento natural pelos animais" – mais adequadamente conhecido como “serviços ecossistêmicos” - não costuma ser evidenciado, dando-se preferência ao plantio de mudas e sementes exóticas "pelas mãos do homem”, o que deve também ser organizado através da criação de hortos municipais, sem menosprezar o "trabalho" dos organismos nativos em geral.

            As florestas contribuem para a contenção dos processos erosivos - evitando enchentes e desabamentos - amenizam a temperatura nos grandes centros urbanos, produzem uma série de princípios curativos muito usados pela população, fornecem madeiras para diversos fins, essências, fibras e óleos. As florestas são organismos vivos e dependentes, onde os animais NÃO VIVEM NELA SOMENTE, MAS FAZEM PARTE DELA E SÃO FUNDAMENTAIS PARA SUA SOBREVIVÊNCIA. Justamente por esse motivo é que precisamos conservar nossa biota porque todos esses organismos trabalham gratuitamente para nós, incessantemente. Profissional e tecnicamente falando, quem melhor para recuperar e manter as florestas?

             Outro assunto importante e que tem a ver com a biodiversidade é a conservação dos recursos bióticos que existem nas coleções das águas doce, salgada e salobra. Só mais recentemente é que os invertebrados foram considerados em nossas listas de espécies ameaçadas. São seres bem diferentes daqueles que vivem nas florestas de terra firme, nem por isso menos importantes. Rios, lagos, lagoas, manguezais, estuários, mares e oceanos, fornecem uma incrível quantidade de proteína para as populações humanas de diversos continentes do planeta. E embora os peixes façam parte da fauna – porque são zoologicamente assim classificados – você encontra esses organismos sendo comercializados em feiras e mercados sem que isso seja percebido como uma transgressão legal, embora seja proibida por lei que os animais pertencentes ao patrimônio nacional sejam explorados pela sociedade sem estudos e autorizações cientificamente orientadas. As estatísticas brasileiras sobre o volume de peixes capturados na costa atlântica brasileira são incompletas e falhas. Carecemos de equipes especializadas em recursos marinhos. Estamos exterminando espécies que não chegaram nem mesmo a ser classificadas, totalmente desconhecidas. Daí a necessidade de nos preocuparmos com a boa qualidade da água e os perigos da erosão e assoreamento nesses ecossistemas, porque somente livres de poluentes e de outras alterações físicas é que poderão manter e permitir a reprodução das populações vegetais e animais que dela dependem, tanto ou mais do que nós.

            Apesar de termos conhecimento do valor desses recursos - e do mal que lhes temos causado - muito pouco temos realizado para reverter a atual situação. Precisaremos, urgentemente, acelerar esse processo de restauração ambiental para resguardar a nossa própria sobrevivência, seriamente ameaçada. Assim, torna-se necessária a real participação governamental, especialmente a nível do município porque está mais próximo dos problemas e pode melhor controlá-los. Muitas vezes, mais do que recursos financeiros e humanos, o que falta realmente é a vontade política, que desencadeia as demais. Os municípios precisam se organizar melhor para atuar em seus ecossistemas, preservando-os ou recuperando-os, ao invés de esperar somente que o Estado resolva a maioria de seus problemas, como normalmente acontece. Para orientar procedimentos e outros atos oficiais esperados por parte das Prefeituras, estamos apresentando as seguintes sugestões:


1- Que os assuntos referentes ä flora e ä fauna sejam tratados em conjunto sob o título CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE.
          2- Que os ecossistemas que ultrapassem os limites políticos do município sejam estudados e manejados em conjunto com os municípios vizinhos, para que não haja descontinuidade e desigualdade de tratamento nos assuntos ecológicos - que desconhecem limites político-geográficos. Normalmente as bacias e micro-bacias hidrográficas são as unidades aconselháveis para desenvolver estudos e planos.
          3- Que sejam criados e considerados prioritários SERVIÇOS, DIVISÕES E DEPARTAMENTOS, que atuem sobre o tema BIODIVERSIDADE MUNICIPAL, o que não impedirá ações em conjunto com universidades, organizações não governamentais, associações de moradores, entidades religiosas, clubes de serviço e outros segmentos da sociedade que possam colaborar nesse trabalho integrado.
         4- Que as equipes que fiscalizam o uso dos recursos naturais do município, sejam treinadas nos temas ambientais onde deverão atuar, para o adequado desempenho de suas funções.
        5- Que o orçamento municipal priorize recursos financeiros para equipar e manter as equipes de fiscalização e auditoria ambientais.
     6- Que para seleção de áreas a serem protegidas sejam consideradas  não somente aquelas indicadas pelo Estado como Unidades de Conservação, mas também  quaisquer outras que sejam vitais para a manutenção da boa qualidade de vida do  município.
       7- Que a fiscalização seja rigorosa nas áreas que sofrem pressões fortes com destruição de formas jovens de animais, suas larvas e ovos, como é o caso das ilhas, praias, costões rochosos, manguezais, lagunas, brejos, etc. A poluição, na maioria das vezes, mata muitos  animais microscópicos que não são visíveis a olho nu. A quantidade desses seres é infinitamente maior do que todos os adultos que podem ser colhidos mortos ou fotografados para notícias em  jornais.
       8- Que na delimitação de áreas de importância ecológica para a flora e a fauna se dê prioridade àquelas que possuam maior extensão e continuidade de cobertura vegetal, sem maiores interrupções entre elas. É preciso também lembrar que áreas degradadas não são sinônimos de áreas irrecuperáveis, devendo essas serem também consideradas para a salvaguarda de recursos naturais, mesmo que se tenha que atuar alguns anos para resgatá-las, como é o caso de manguezais e restingas que foram perturbados ou seriamente modificados em suas áreas de origem. Para tal, se estimulará a regeneração natural através de  cuidados e técnicas diversas, além do plantio de sementes e  mudas, entre outras.
     9- Que no monitoramento dos impactos ambientais causados pela poluição atmosférica, hídrica, do solo etc, sejam incluídos também os malefícios que causam sobre as plantas, animais selvagens e seus ecossistemas, e não somente em relação ao homem, porque se o equilíbrio biológico ficar prejudicado as consequências redundarão em prejuízos humanos.

    10- Que ao lado de ações fiscalizadoras e punitivas seja implantado um amplo programa de educação ambiental no município desde a pré-escola, de modo a atingir o maior número possível de públicos, incluindo-se neles, principalmente, os empresários e políticos locais.
            Eis aí os 10 princípios básicos que sugerimos cuja viabilidade dependerá, fundamentalmente, da sensibilidade dos poderes decisórios municipais e da própria comunidade em relação ä causa conservacionista. O mais é sair do discurso para a prática, de modo que os lucros auferidos passem a ser contabilizados sob uma nova forma de investimento, que muito mais que valores financeiros acumulam reconhecimento público, seriedade administrativa,  respeito ao próximo e à vida.


sábado, 28 de março de 2015

Ainda em París?


Colaborador ROBERTO ROCHA

A insensibilidade e a ignorância em relação às questões de preservação do nosso patrimônio é facilmente explicável porque os atuais ditos “brasileiros” que estão no poder empresarial são na verdade “europeus em terra estranha”; muitos deles mestiços, porque seus ancestrais recentes se acasalaram com negros e índios. Indígenas (brasileiros autênticos) e africanos não mestiços (também autênticos), representam o melhor grupo humano que compreende o valor do equilíbrio ambiental tropical, porque possuem tradições milenares. E a nossa tradição brasileira – construída a partir de estratégias de países do gelo – qual é? Em pouco mais de 500 anos, nosso equivocado modelo de uso da terra mostrou seus erros. Os índios, “ditos incivilizados” – porque não acompanharam a “civilização” dominante da Europa – foram exterminados para que novas populações exóticas ocupassem o mesmo espaço, alardeando seus modelos de exploração. Os índios não “exploram”: eles “convivem”! Os indígenas preservaram nossas florestas, rios, praias, lagoas e tudo que se possa imaginar, durante “milhares de anos”. Lamentavelmente não valorizamos a nossa (?) própria história. O que somos hoje? Fruto de um modelo da idade moderna, antropocêntrica, que – apesar do apelo da época (que gritava nas ruas da França pela liberdade, igualdade e fraternidade) – estimula a ausência do Estado nas questões fundamentais e privilegia fortemente o privado para interferir no que é público. É verdade que estamos hoje num caminhar doloroso, aprendendo com nossos graves erros do passado, tentando consertar parte do que ainda tem conserto. Mas como consertar a alma? O sentimento de perda vai ficar. A ferida pode até fechar! Pode não doer mais. No entanto, não podemos esquecer que nosso DNA original está vivendo aqui como exótico e invasor. Trouxemos conosco nossos acompanhantes também exóticos e invasores (boi, cavalo, porco, cachorro, gato, galinha etc). Que justamente por isso, temos uma enorme dificuldade de entender a estratégia indígena de ocupação e uso do espaço. Que justamente por isso somos incompetentes em lidar como a gestão de ecossistemas tropicais. O Rio de Janeiro do início do século XX parecia Paris. As pessoas (os privilegiados) se vestiam como se estivessem na Europa. Somos uma continuação deles. Precisa dizer mais?