domingo, 2 de janeiro de 2011

O feitiço contra o feiticeiro


Colaborador Roberto Rocha

Incrivelmente, o impacto econômico causado pela recessão mundial traduziu-se na maior bênção ecológica desse início de século: os níveis de poluição diminuíram. Outra vez, fica provado que nada acontece isolado. Somos sistemas integrados e dependentes. Não importa se os argumentos estão apresentados em suas modalidades antropofragmentadas: ambiental, econômica, social ou cultural. Nada pode ser resolvido separadamente. Nenhum cérebro econômico raciocina sem ar, sem água, sem nutrientes, sem estímulos naturais que justifiquem a existência da visão, do olfato, da audição ou do tato. É irreal! Nosso corpo foi codificado em bases e parâmetros da natureza. Precisamos do canto dos pássaros, do quebrar das ondas numa praia, de ouvir os ventos nas montanhas, das quedas das cachoeiras, dos bordos picotados de cada folha diferente, dos aromas das flores e suas cores. Sem essa riqueza, somos meros autômatos a serviço de sistemas simplificados e pobres, embora chamem a isso de “complexa rede tecnológica”. Não que eu seja contra ela. Longe disso! Se assim não fosse eu não poderia agora estar aqui expondo minhas leituras e percepções do mundo através de uma rede de computadores que pode chegar a qualquer parte da Terra. É uma ferramenta maravilhosa. Reforçando: é uma ferramenta! Por trás dela precisa haver um cérebro pensante e sensível às emoções, o que nos classifica como seres humanos biológicos. Não há como contestar esta realidade. Embora eu tenha aprendido, do ponto de vista acadêmico, que não devo radicalizar, gostaria de abrir aqui uma exceção. Não abro mão de me manter biológico. Inventar, criar, estimular, praticar qualquer coisa não biológica precisa estar, necessariamente, associado ao bom senso, à reflexão, à bioética, à sabedoria, porque acredito que estas qualidades fazem parte de nosso mecanismo natural de “viver em sociedade”. Se assim não for estaremos descendo ladeira a baixo, sem freio, sem cinto de segurança, sem “air bag”, sem seguro de vida, frágeis. O século XXI nos cobra um posicionamento definitivo, depois de toda a nossa história escrita desde antiguidade. Nossos ancestrais hominídeos primitivos do paleolítico não tinham esse tipo de preocupação. Os desafios para a sobrevivência humana eram outros. No entanto, a condição “biológica” não mudou em todo esse tempo e nem vai mudar. Então, temos aqui um problema: até onde nós humanos, seremos capazes de negar ou tentar substituir padrões naturais que forjaram a nossa própria origem? Você saberia qual o limite? O ano de 2009 está nos convidando à reflexão, mais uma vez. Já tínhamos participado de outras propostas semelhantes. Lembram da Conferência de Estocolmo (1972)? Da Conferência do Rio (1992)? Da Conferência de Johannesburg (2002)? Dos Objetivos do Milênio até 2015, entre outros? Dessa vez temos um tema central: o aquecimento global. Estampado nos meios de comunicação, nas discussões do Painel Intergovernamental de Mudança do Clima, nos protestos de algumas ONGs. Mas uma questão me preocupa: onde ficou a saúde mental? Onde está a preocupação com as exigências naturais do cérebro humano? Imagine um computador sem informações e sem processamento. Ele seria totalmente inútil. Mesmo cercado de toneladas de ouro, corremos o risco de não poder usufruir de tudo isso que conquistamos tão rapidamente. Corremos o risco, desculpe o neologismo, da “demência tecnológica”. De uma sensação de vazio permanente, mesmo cercado de milhões de carros e prédios, de piscinas e de supermercados. No fundo, sempre seremos primatas sociais e dependentes cerebrais exigentes de uma percepção megadiversa. Ou reconhecemos isso, ou traçaremos um futuro incerto e perigoso. Que não terá como argumento principal toda uma história milenar de sentimentos e trocas com a “natureza”, de onde todos nós viemos, para onde todos nós iremos, afinal o que todos nós somos...

sábado, 1 de janeiro de 2011

Vamos ajudar a REVECOM !


O médico Paulo Roberto Neme do Amorim é um conservacionista nato que conheço  há meio século. Em sua luta para preservar a biodiversidade amazônica protege os recursos regionais e cuida pessoalmente dos trabalhos educativos e assistenciais envolvendo crianças, adultos e idosos, especialmente os mais necessitados. São raras as pessoas com o potencial e a bondade do Paulo, que admiro e respeito profundamente. Infelizmente o Brasil ainda não alcançou um patamar exemplar no cuidado com os seus ecossistemas mais significativos. A Mata Atlântica é um exemplo da devastação sofrida e capitaneada pela sede de produzir a qualquer custo, sem se preocupar muito com o destino das gerações futuras. Depois de séculos de degradação, estamos agora tentando compreender o que fizemos e o que causamos. No entanto, ainda teremos que lutar desesperadamente para salvaguardar, pelo menos, parte do que foi a nossa riqueza natural  Segue abaixo o apelo do Paulo Roberto que estou aqui copiando e rogando a todos -  que de alguma forma possam ajudá-lo - para entrar em contato urgentemente. Agradeço a todos que puderem contribuir. Muito obrigado, de coração.

Roberto Rocha

Segue o apelo do Paulo Roberto:

Inicialmente peço desculpas pelo incomodo. Não o faria se nossa situação não fosse particularmente grave.


Há cerca de treze anos, quando da criação da Reserva Particular do Patrimônio Natural REVECOM, sofri muitas críticas e descrédito por parte das pessoas. Permeamos a RPPN REVECOM ao público em geral.

Nossas atividades, sem anúncios foram disponibilizadas a mais de trinta mil pessoas através do PEACE – Programa de Educação Ambiental, Cidadania e Espiritualidade e quase mil animais silvestres receberam atendimento humanitário no PVAFS – Programa Voluntário de Atendimento à Fauna Silvestre.

Através de uma taxa ambiental os visitantes colaboram com a manutenção do espaço e o atendimento gratuito à população carente, deficientes visuais e cadeirantes. A receita gerada é aplicada exclusivamente na RPPN, pois sua mantenedora não possui atividades comerciais exceto aquelas necessárias para o bom funcionamento da RPPN.

Em momentos de crises financeiras pessoas e empresas nos apoiaram com doações e convênios de cooperação. O Estado e o Município de Santana estabeleceram convênios.

Uma década após a criação, a RPPN REVECOM é uma Unidade de Conservação do estado do Amapá muito conhecida a nível nacional e internacional, conforme uma pesquisa na WEB. É visitada devido aos programas socioambientais e culturais desenvolvidos.

A RPPN REVECOM não é um espaço comercial é um espaço ideológico onde declaramos nossa responsabilidade uns para com os outros, com a grande comunidade da vida, e com as futuras gerações.

Foi construído e é mantido com o árduo trabalho dos seus idealizadores e família, empregados, voluntários e outras pessoas e empresa que comungam com seus princípios ecocêntricos e fundamentos de uma adequada educação ambiental, com base na Carta da Terra, visando um mundo melhor. Infelizmente, porém, estamos enfrentando uma nova crise financeira.

O fechamento do orçamento do Estado do Amapá, em NOV 30, devido à transição de governo, prejudicou a renovação/aprovação de novo projeto semestral para a RPPN solicitadas em novembro. Os procedimentos estão suspensos até a abertura do orçamento 2011, o que representa menos oito mil reais nos já combalidos recursos disponíveis mensalmente, o que é catastrófico para a RPPN.

O valor que se ausenta representa cerca de 61% dos recursos de convênios de cooperação firmados. Passar para 2011 tal ajuda, em prazo ainda não definido, afeta gravemente a essencialidade dos serviços prestados pela RPPN: o PVAFS, hoje atendendo mais de 500 animais o PEACE e o importante custeio da mão de obra cativa.

O repasse semestral realizado pelo Estado, em junho de 2010, exaure-se nesta primeira quinzena de dezembro, nos projetando num vórtice de problemas: o atraso do pagamento da mão de obra, dificuldades com a alimentação dos animais, dentre outros.

Reconheço que, recentemente, o GEA tem sido um parceiro exemplar e que ainda nos ajudará muito, pois existem recursos em caixa, das medidas compensatórias, que poderão ser usados para custear a RPPN ano a ano, ao invés de uma mínima ajuda semestral.

Constrangido, coloco meu pedido de ajuda para V. Sa. que já esteve aqui e conhece nosso trabalho. Juntos, e com a sua doação, poderemos vencer mais uma crise, mantendo a RPPN REVECOM em funcionamento e em contínuo crescimento, espalhando conhecimento por todo lado, lutando por um mundo melhor.

Contamos com sua compreensão. Por favor, nos ajude a enfrentar esta fase que está nos projetando nesta lastimável situação.

Atenciosamente,

Paulo Roberto Neme do Amorim

Reserva Particular do Patrimônio Natural REVECOM, Santana, AP.

Gerente Técnico Voluntário e Guardaparque

Earth Charter Volunteer

www.revecombr.com.br ; http://rppnrevecom.blogspot.com/

pn.amorim@uol.com.br ; revecombr@bno.com.br

Tel: 55 96 3281.3849 Cel: 55 96 9971.2155


PS: As doações poderão ser depositadas na conta:

Conta corrente 52129-9

MANTENEDORA: AMORIM E AMORIM LTDA EPP – CNPJ 01.477.979/0001-56

Agência 3346-4 Banco do Brasil

Entre o solo e o inferno

Colaborador Roberto Rocha

A cada dia aumentam os prejuízos causados por erros humanos e as mudanças climáticas em todo o mundo. A partir de agosto de 2010 preocuparam os incêndios em Portugal e Espanha. Na Rússia, por causa das queimadas, as exportações de trigo sofreram restrições para não prejudicar seus estoques estratégicos e o consumo interno. A fumaça cobre Moscou e as pessoas usam máscaras. E os eventos ainda continuam.

No Brasil, os prejuízos causados com os incêndios já são enormes. No próximo ano a situação pode ser mais séria ainda. A temperatura média do planeta vem aumentando, paulatinamente. Esse fato, nos leva a pensar numa umidade do ar muito baixa e mais matéria seca disponível.

É verdade que sempre tivemos variações de temperatura na história da Terra, mas elas não afetavam tantas pessoas ao mesmo tempo e nem tantas monoculturas ensolaradas e quentes. As florestas protegem a água e ajudam a manter a umidade do ar elevada, mantida através de suas sombras generosas e frias.

Muitas cosas mudaram. A população mundial era bem menor. Não tínhamos cidades-sem-fim com seus imensos blocos de concretos e ferro, encarreirados, fumegantes. E nem tantas avenidas barulhentas durante a semana: verdadeiros cemitérios aos domingos, onde ratos e baratas se arriscam a sair dos esgotos gaseificados e silenciosos, para um merecedor repasto. As noites dos fins de semana deixam muitos resíduos nutritivos e interessantes.

Não víamos tantas áreas devastadas sendo ocupadas por monoculturas intermináveis e “queimadas para limpeza” dos excessos fibrosos que atrapalham o ganho lucrativo do pó branco, o açúcar; ou do líquido energético, transparente e puro, o álcool.

Com a fumaça, os olhos ardem a nos indicar a agressividade do ambiente hostil, mas nem sempre nossas narinas, viciadas nos corriqueiros cheiros tóxicos, conseguem nos alertar, eficientemente.
Nas cidades próximas, crianças e idosos tossem e tossem, tentando arrancar as poeiras agarradas nos cílios desidratados do aparelho respiratório. O que será que estamos construindo como sinônimo de qualidade de vida ?

Se nós - tão civilizados e tecnologicamente corretos - sofremos tudo isso, imaginem as plantas e animais indefesos que convivem nesse mesmo cenário.! Quem os protege? Quem lhes oferece o oxigênio ou o alívio de suas crises asmáticas asfixiantes na dose certa?

Alguns locais do Brasil central, nessa época em que chove menos, se parecem com situações do deserto de Sahara, no norte da África, onde numa umidade entre 10% e 15% só sobrevivem os organismos altamente adaptados a essas situações extremas.

O fogo se espalha e cresce; crispa e avermelha o céu pontilhado de fagulhas e leves plumas pretas flutuantes. Atordoados e indecisos alguns animais procuram se safar como podem. Os que têm pernas compridas, correm. Os que se arrastam e pulam são mais lentos e enfim engolidos pelo inferno quente. A pequena rã vê sua pele tostar e perder a elasticidade vital e se transforma numa iguaria apreciada por outros ou numa bola preta carbonizada. Se não anoitecer logo, a secura do ar vai aumentar ainda mais. Mas o fogo parece se acender do nada, como uma mágica escaldante.

Um piolho de cobra (miriápode ou milipede) - com suas "mil" pernas - mesmo sendo tantas, não consegue progredir grande coisa. Se enrosca e se abriga inutilmente. O solo está quente demais para a sua ingênua pretensão.

Um caramujo terrestre (aruá) foge apressado procurando um abrigo onde o fogo não o alcance. Ou então, será lambido por uma língua vermelha e implacável. Morrerá em seu próprio envoltório, como um caixão natural, devidamente assado.

Poderia estar sendo servido num restaurante fino, como iguaria. Mas certamente não será temperado com alguma erva especial.

As aves de rapina cercam alguns outros seres desesperados, aproveitando-se do momento macabro para capturar uma presa fácil. Sua inteligência prodigiosa consegue enxergar e diferençar uma desgraça de uma dádiva.


Os condenados, asfixiados pela fumaça, batem nos galhos ou tropeçam aqui e ali, tentando se restabelecer, enquanto os talões ponteagudos e cortantes cravam fundo nos pulmões e fazem parar uma vida para fazer viver uma outra, mais bem armada, eficiente e eficaz. O cheiro dos cadáveres das plantas e dos animais se espalha e atrai mais predadores oportunistas.

O fogo passa e deixa um rastro de palitos pretos em seu caminho, rodeados de uma fuligem fina que o vento vai levando, aos poucos. Depois, só as brasas.

Alguns abnegados da brigada de incêndio combatem o fogo, abafados e abafando aqui e ali, sem água por perto, com parcos recursos, na tentativa de conter o gigante devastador que vai conquistando território ajudado pelo vento e a ausência da chuva redentora.

O jeito agora é esperar a estação das chuvas e aguardar o que poderá brotar naturalmente, depois de um longo sono sazonal. Se conseguir resistir ao fogo provocado pelo homem e aos incêndios naturais ajudados pelo ar seco, a biodiversidade terá alguma chance outra vez. Até que a terra se torne totalmente estéril, e nem mesmo o homem possa criar nela um novo inferno. E tudo ficará sem graça, sem cadáveres queimados, sem odores e sem predadores. Sem gado, sem capim, sem gente, sem floresta. Só a areia branca e alguns ossos esturricados, testemunhas da nossa irracionalidade e ganância, desenfreadas.

Crescimento pibiesco alienado - CPA

Colaborador Roberto Rocha

Já tinhamos falado um pouco sobre a invasão poluidora das siglas no artigo "Nosso Futuro Incomum: descompromisso com o amanhã"  do marcador Educação socioambiental e sustentabilidade. Mesmo com a consciência um tanto pesada, não resisti ao título e estou aqui contribuindo para a poluição sigliesca com uma única justificativa compensatória: contribuir para a reflexão coletiva. A questão é que sempre me incomodou muito o fato de se pautar o crescimento de um país, com base - quase que sagrada - no famigerado PIB. Nunca fui contra o crescimento humano, mesmo quando traduzido em conquistas tecnológicas, porque se assim fosse não seria sensato estar aqui usando uma máquina sofisticada em conexões artificiais. No entanto, acredito que o equilíbrio de qualquer sistema depende muito mais de reflexões do que de criatividade e inovações emparedadas. Qualquer criação precisa considerar a realidade do todo na qual ela está inserida. Leituras equivocadas podem estimular, despercebidamente, comportamentos padrões deletérios que não contribuem para a permanência de complexidades saudáveis.


Quando afirmamos que "uma planta cresce" voce pode ter certeza de que tudo que vai acontecer - a germinação da semente, a produção de flores e frutos, o envelhecimento do tronco, sua queda e seu apodrecimento - estará em acordo ecológico com o "todo" pré-existente. Isso porque existe um pano evolutivo que está por trás de tudo o que acontecerá. É como se existisse um pacto cósmico que se compremete a manter tudo e todos perfeitamente integrados, antes, durante e depois do que chamamos "morte". E como será que funcionam as teorias econômicas baseadas no Produto Interno Bruto? Até o nome é bruto, deseducado.  Será que se baseia na contribuição de cada setor perfeitamente integrado no todo?  Ou desconhece a realidade ao lado, da qual ele também é parte? Sempre sonhei com a possibilidade de  que os economista seriam, antes de tudo, grandes especialista em Ecologia. Eles seriam perfeitos, ou quase isso. Os ecologistas são economistas natos, porque a natureza funciona em bases econômicas. Só posso aceitar o tipo de desenvolvimento louco que incentivamos, a partir da premissa de que "nós é que determinamos participar dessa alienação e até nos especializamos nela". O crescimento baseado no PIB só considera as variáveis ecossistêmicas  pré-determinadas mas não as que seriam as mais importantes. Dessa forma, nosso crescimento pibiesco não é equilibrado. Ele é sempre provisório, com foco no lucro de minorias, enquanto o verdadeiro crescimento "ecológico" se baseia no equilíbrio da maioria. Alguns economistas já perceberam o equívoco e estão agora tentando sensibilizar a "elite" do século XXI para novos horizontes. mais criativos e menos autoritários em suas "teorias próprias". A  verdade é que não precisamos inventar muita coisa, mas apenas transferir as regras da natureza para as nossas regras acadêmicas. Antes de sermos primatas sociais, somos animais autênticos, dependentes das regras da Terra. A robótica não deve nos substituir, mas sim nos liberar para meditar profundamente sobre o que desejamos ser num futuro não muito distante.       

Futuro da biota em áreas ilhadas e simplificadas

Colaborador Roberto Rocha

Enquanto o aquecimento global preocupa o mundo com suas ameaças e prejuízos futuros, os animais continuam suas rotinas de sobrevivência em seus respectivos ecossistemas sem saber exatamente o que significa IPCC e sem ter visto o filme “Uma Verdade Inconveniente”, do Al Gore. Algumas espécies mais “resistentes” ainda sobreviverão por algumas décadas. As mais sensíveis sofrerão baixas significativas e estarão, em sua maioria, nas listas da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais) numa de suas categorias: vulneráveis (VU), em perigo (EN) ou criticamente em perigo (CR), até que sejam extintas (EX) e ninguém encontre mais nenhum exemplar durante 50 anos.

Para a preservação de espécies diversas e dos ecossistemas dos quais elas dependem, contamos com as áreas protegidas, tais como as unidades de conservação, áreas de preservação permanentes (APPs), reservas legais e áreas indígenas. No entanto, mesmo essas áreas, estão ameaçadas por interesses econômicos exclusivos que alimentam um modelo econômico estimulado claramente pela obtenção de lucros rápidos. Mesmo algumas áreas vistas como exemplos de conservação, sofrem os impactos da insensibilidade e a falta de bom senso.

A Floresta Atlântica, ao invés de ser reconhecida por sua riqueza e variedade de formas, como era num passado não muito distante, é hoje o bioma mais ameaçado do Brasil e foi classificado como um dos 34 hotspots do mundo ao lado do cerrado (em degradação acelerada). Hotspot é uma área que está sofrendo agressões causadas por atividades humanas desregradas e que necessita de intervenções urgentíssimas para sua preservação. Basta visitar o Parque Nacional da Tijuca e o Parque Estadual da Pedra Branca no Rio de Janeiro, por exemplo, para se perceber que ali já não existem mais nem os grandes predadores terrestres (onça pintada, onça parda) e nem os alados de grande porte (gavião real, gavião pega-macaco). Foram extintos.

Essas unidades de conservação de proteção integral não estão mais íntegras e encontram-se agora totalmente ilhadas, não permitindo uma troca saudável de material genético com outras populações mais próximas. Só as espécies que voam tem alguma chance. Mamíferos, répteis, anfíbios e insetos são literalmente “atropelados” pela ação humana. Ou ainda, pela gastronomia, pelos colecionadores compulsivos, na boca dos cães e nas garras dos gatos que vivem dentro e na periferia dessas áreas. Sem contar os “caçadores urbanos”, de fim de semana, com suas carabinas de pressão a impressionar seus filhos e amigos. Enquanto isso a fragmentação das florestas aumenta a cada dia. Vai ser difícil conter a urbanização. Onde estão os incentivos para estimular os estudos da fauna? O que estão fazendo as secretarias municipais existentes no bioma mata atlântica para minorar tais aberrações? As florestas estão cada vez mais vazias. A continuar assim, será muito fácil classificar as espécies nativas remanescentes. Isto é, uma meia dúzia de três… E com certeza, haverá um grande número de espécies exóticas, tranquilamente instaladas e proliferando por aí. Já está acontecendo...

Nosso futuro incomum: descompromisso com o amanhã?


Colaborador Roberto Rocha

No outro dia, achei num sebo em Niterói (RJ), um livro que eu já tivera, - comprado na Fundação Getúlio Vargas - no Rio de Janeiro: Nosso Futuro Comum – Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1a  ed. 1988; 2a ed. 1991). O título original em inglês “Our Common Future” (1987) foi mantido, diferentemente do que costumamos ver com alguns filmes, em improvisações horríveis e pouco criativas. Embora a intenção tenha sido louvável, nós não alcançamos os resultados alardeados nos quatro cantos do mundo. O futuro continuou a ser uma incógnita num planeta globalizado e tocado pelo capitalismo desatento. Por questões de soberania, até entendo que não se pode “enfiar garganta abaixo” qualquer proposta, por mais interessante que aparente ser. Estão envolvidos nisso, interesses atuais, tradições seculares e crenças milenares. Resultado: não deu certo!. Pode realmente ter influenciado o pensamento de uns poucos, elitizados. O “povão”, como costumam tratar, continua correndo atrás do “dinheiro da passagem”, da “dívida no cartão”, do sonho de “uma casinha para morar”, de “não levar bronca do patrão” por ter chegado atrasado, se “ vai dar praia no final da semana”, “se o timão vai ser rebaixado” e tantas outras situações semelhantes. E então começam a aparecer diversas “terminologias estranhas” na televisão, nos jornais e revistas, do tipo: “Relatório Stern” (será sobre algum novo desfalque descoberto pelo Polícia Federal?); IPCC (será uma nova facção?); CEO (lugar onde vivem os anjos?); REDD (marca nova de roupa?); Objetivos do Milênio (nova novela das oito?); COP 15 (algum novo festival de bebida?): quem agüenta tanta sigla? A propósito: você - possivelmente uma pessoa “letrada” – sabe o que significa exatamente cada termo desses? Se sabe, parabéns! Se não sabe, prepare-se para os novos termos e siglas que certamente surgirão nos próximos anos. O fracasso da Convenção de Copenhague vai exigir muita imaginação para que cada país desenvolvido tente explicar por que não vai “co-operar”, isto é, por que vai continuar a “operar sozinho”, sem sacrificar as magras (?) economias que tocam ao seu disputado pedaço de bolo global. A preocupação maior é com os prejuízos previstos. A economia brasileira segundo o EMCB (você sabe o que é?) - disponível em: http://www.economiadoclima.org.br/ - corre o risco de perder, caso nada seja feito, a singela quantia de R$ 719 bilhões ou R$ 3,6 trilhões em 2050 (precisão é tudo!). Será que poderemos fazer revisões a cada cinco anos? As regiões mais afetadas serão o Nordeste e a Amazônia, conforme já apontaram alguns cientistas É claro que o calor, a seca e o excesso de água são fatores estressantes muito bem conhecidos e que derrubam qualquer planejamento para a agricultura. A geração de eletricidade também poderá sofrer defasagens. No entanto, acredito que será nessa área onde teremos mudanças positivas e que poderão contribuir para que as perdas não sejam tão intensas. O mais lamentável (?) mesmo, não será a perda das monoculturas e do gado, mas a perda da biodiversidade indígena (nativa) brasileira, ameaçada especialmente por mega-projetos que podem não atender exatamente às regras da natureza. Somos ainda muito ignorantes em conhecimentos básicos até mesmo sobre um só bioma! Imagine todos os biomas brasileiros funcionando e trocando energia e matéria, ao mesmo tempo? É uma verdadeira loucura!. Mas agora pense também que existem mudanças globais que podem afetar tudo isso ! Tenho um certo pavor quando falam de “adaptação” porque aprendi que esse fenômeno é muito lento. É preciso acreditar muito na engenharia genética como solução urgente para tais questões: e como fica o "princípio da precaução"?.  Outro sério problema será como organizar os deslocamentos de populações pressionadas pelas mudanças do clima: os refugiados ambientais. Mesmo que haja a possibilidade de que países “desenvolvidos” liberem tecnologia avançada para os países mais pobres, teremos que ter aqui um arsenal de “cérebros”. Precisamos estar prontos, esperando esses conhecimentos, capazes de compreendê-los e de aproveitá-los rapidamente, para não correr o risco de ficarem mais defasados ainda. Temos no país brilhantes grupos de cientistas que poderão ser mais incentivados a partir de novos recursos governamentais.Veja que não se trata de uma situação rotineira. É questão de crise de grandes proporções. Não poderemos estar errando em nossas previsões! Não haverá muito tempo para isso! Se as inundações do sul, continuarem a crescer – por culpa ou não do El Nino ou qualuqer outro motivo – as questões socioeconômicas poderão se agravar. Esperemos que seja somente um momento crítico que venha se normalizar logo. Como uma das medidas a serem tomadas, temos uma óbvia urgência: a de estancar o desmatamento da Amazônia. Deveríamos – ao mesmo tempo - investir maciçamente no reflorestamento de “áreas degradadas” e capacitação de comunidades, já pensando em alternativas de sobrevivência natural e menos dependente de monoculturas. Por exemplo, saber se é possível comer folhas de amoreira e de outras espécies florestais  – que cresçam rapidamente e cujos troncos “peguem de galho” sem precisar plantar sementes e ter que esperar mais ainda. Algo que uma comunidade ilhada possa obter como alimento (plantas aquáticas comestíveis?), sem depender tanto de estradas ou de aeronaves. Como purificar água, de modo seguro, para dessedentar as famílias isoladas em áreas elevadas? Durante enchentes, os animais da região também procuram as áreas mais altas; e isso pode gerar muitos problemas, especialmente doenças conhecidas como zoonoses, que passam de animais para o homem e vice-versa - a leptospirose que o diga!. Pessoas aglomeradas facilitam a passagem de virus, bactérias, protozoários  – de um indivíduo para outro - através de vetores (especialmente os insetos). A segurança alimentar também pode ficar comprometida: comer ratos não parece ser algo inviável numa situação crítica. O grande desafio que temos é que os sistemas naturais não seguem as regras econômicas humanas e, nesse momento, precisamos das duas. Já estamos nos preocupando com “mitigações” mas devemos também pensar em soluções mais “reais e palpáveis” que possam atender - mais rapidamente - uma enorme população de “pobres” porque eles certamente serão a maioria “em dificuldades”. Assisti ao filme 2012, no outro dia. Uma ingenuidade! Mas afinal, é ficção! E bota ficção nisso! Os “pobres” eram na verdade uma elite. Os que embarcaram eram mais especiais ainda. Os pobres “reais” nem apareceram! Eles são a maioria no mundo. Os animais da “arca” eram os que costumamos ver em jardins zoológicos: como se o mundo pudesse funcionar com essa ínfima amostragem!. Não percebi um destaque especial para salvar bactérias e fungos, indispensáveis decompositores na biosfera. Continuamos a entender o planeta constituído de individualidades e não de sistemas complexos. Quando olho para as estradas do país - e vejo os veículos circulando - lembro dos carreiros de formigas nas florestas, em suas correrias intermináveis. Elas se comunicam umas com as outras. Os veículos também obedecem a uma sinalização previamente conhecida. Mas quanta diferença nessas andanças! As formigas cortam as folhas das plantas doentes ou daquelas que elas já sabem que estão fragilizadas. Procuram então levar esse “alimento” para as suas "criações de fungos" e fazem reciclar o sistema com perfeição. Elas sabem que o que chamamos de árvore é apenas um momento provisório de matéria geneticamente programada. Que estão apenas transferindo o “ambiente” de um local para outro. Não possuem nenhuma preocupação - como nós humanos – com aspectos éticos de como tratar um moribundo ou um doente em apuros. No entanto, será que nós estamos, realmente, preocupados com a natureza? Nosso comportamento nesse caminho de muitos é compatível com uma solidariedade dita mundial? Estamos preocupados com o “outro”? Humano ou não? Essa pode ser uma reflexão necessária nesse momento de frustrações internacionais e de promessas vazias que enchem auditórios de personalidades. Pelo menos, o Brasil deixou um recado claro, mesmo sabendo das dificuldades que teremos para cumpri-lo. Foi o destaque da conferência no meio de tantos descompromissos. Nosso futuro só poderá ser comum num mundo onde a desigualdade não separe as pessoas de suas realizações e sonhos. Onde se respeite o ambiente tanto quanto o próprio homem, já que são uma coisa só. É dessa compreensão incomum que precisamos para o bem de todos, seja na forma de água, de planta, de animal, de gente ou qualquer uma outra...

Mudança do clima: que clima?



Colaborador Roberto Rocha

Mudanças geram expectativas. Será que vai dar certo? Quando pensamos em mudar, significa que algo atingiu um certo limite, bom ou ruim. Os limites nos acompanham há milhares de anos como criaturas humanas. Inteferiram na evolução dos dinossauros quando o Homo sapiens nem existia. A maré sobe e desce, religiosamente. Os caranguejos sabem exatamente até onde ela vai, sem nenhum alerta ou aparelho tecnológico para lhes indicar o que vai acontecer. Caranguejos são excelentes bioindicadores. Lagartas, besouros, mosquitos e escorpiões também. A propósito os mosquitos são muito bons nisso. Eles percebem rapidamente qualquer alteração climática. São excelentes aliados nesse sentido. Plantas também percebem as mudanças. Florações fora de época, filhotes morrendo de fome nos ninhos e suas mães desesperadas em busca da larva que não apareceu no mesmo período. Esses sinais me lembram as Sete Pragas do Egito. Tudo isso nos leva a compreender que o planeta tem regras e obedece a todas elas, embora não haja nenhum código ético escrito pelo homem nesse sentido. Ao contrário, as regras humanas – como o próprio nome indica - foram feitas para humanos e não consideram as questões “ambientais”. Se nos entendêssemos como ambiente, seria mais fácil perceber essas nuances. Mas dizem que nós somos “gente” e pertencemos a uma outra categoria especial, que merece um tratamento diferenciado. Por causa disso, colocamos nossos interesse em primeiro lugar, achando que a nossa tecnologia pode resolver tudo, com certa independência. Mal saímos do século XIX – onde os ratos nasciam de panos velhos e trigo bolorento - e já estamos nos habilitando a resolver a questões do planeta. Somos realmente criaturas especiais. Filósofos antigos não estavam interessados em estabelecer regras. Parece que eles já sabiam que as regras já estavam postas e se preocupavam mais em tentar percebê-las do que criá-las. Refletindo e consultando os oráculos a intenção era para captar algo que a “sociedade” não percebia. E não exatamente para um invento puro e simples, conseqüência óbvia do primeiro fato. Os “pensadores” não receberam este nome, por acaso. Eles desejavam saber sobre as nossas inquietações, aspirações e desejos mais íntimos. Sobre a origem da instabilidade do homem e sua busca por segurança. Quando dizemos que existe um “clima”, entendemos que estão ali elementos indispensáveis para despertar sentimentos, valores, emoções. Que sentimentos estão sendo mobilizados com a mudança do clima do planeta? Descaso? Descrédito? Desunião? Não fique tenso, porque também vamos saber em breve qual o “clima” da Conferência de Copenhague (Dinamarca) em dezembro de 2009. Dos sentimentos ali colocados vão depender alguns milhões de pessoas, plantas, fungos, bactérias e ecossistemas inteiros. Estão em jogo não somente vidas constituídas e dependentes ecologicamente falando. Outros sistemas estarão em jogo: o econômico, o social o cultural. Mudanças na temperatura média do planeta, conforme expectativas dos mais renomados pesquisadores, afetam a segurança alimentar, a migração de desabrigados (refugiados ambientais), novos cenários sanitários. A inativação de vastas áreas planas, seja por inundação ou seca, produzem prejuízos astronômicos. Empresas de seguros correm o risco de não poderem honrar seus compromissos por não terem lastro, caso os seus contratantes estejam “quebrados” pelos desastres ambientais. Qual a saída? Mais tecnologia? A mesma que gerou esta situação atual? Uma “nova” tecnologia? Dependente de pesados investimentos em pesquisa e experimentações adaptativas? Quem banca esses gastos? Estamos “catucando” os sistemas de equilíbrio da Terra, sem nos preocuparmos muito com as reações que virão em contrapartida! Estamos “ferindo o planeta” - e ele está sangrando! As soluções apresentadas parecem sugerir que devemos “ferir menos”, mas sem deter a hemorragia! Vamos torcer que a anemia não tenha sido tão intensa e que uma transfusão de sangue emergencial possa tirar o paciente da UTI. A preocupação é que já estamos quase no final do ano, época de festas, grandes estardalhaços, espetáculos pirotécnicos e bebedeiras, no mundo inteiro. Corremos o risco de não haver sangue suficiente nos estoques das emergências – porque as pessoas se esquecem de doar sangue durante esses eventos festivos. A questão é que se a maioria permanecer nesse clima de orgias e insensibilidades, pode acontecer que eles mesmos venham precisar de um atendimento, quem sabe, tarde demais...

Capacidade de carga: o que é isso?


Colaborador Roberto Rocha

Você já reparou que quando vai viajar, precisa levar alguns pertences "essenciais" na sua mala?. No entanto, nunca você coloca tudo o que imaginou dentro dela, não é mesmo?. Arruma daqui, arruma dali, vai ficando cada vez mais difícil organizar toda a parafernália, num só lugar. Conclusão: é realmente preciso saber o que pode e o que não pode ocupar aquele espaço. Por exemplo, não posso guardar um sorvete sem um recipiente que evite o seu derretimento. Sorvete sem proteção, não pode!.Carne fresca também não pode porque apodrece. Quem sabe, carne salgada? Quer dizer, algumas coisas até podem, desde que sejam respeitadas algumas regras básicas. A questão é como ocupar um lugar tão limitado para satisfazer a todas as nossas necessidades e prazeres. Será que é possível? Se para arrumar uma simples mala a questão já é desafiadora, imagine arrumar um espaço público cheio de diferentes interesses e formas de entender o mundo? Não poderia deixar de comparar a situação da mala com uma situação semelhante: as praias brasileiras..Estamos em pleno verão e nas praias cariocas as pessoas falam sobre o “choque de ordem” – talvez fosse melhor “choque de consciência” ou de “bom senso” – porque é disso que estamos tratando. Não podemos "ocupar" a mala com tudo o que queremos e desejamos. Precisamos de uma seleção e uma ordem de arrumação. Caso contrário: é o caos! Tá certo que o carioca é meio informal, mas não podemos ser anarquistas inconscientes! Não me parece ser liberdade plena, por exemplo, que cada menino solte pipa com linha cortante ameaçando os pescoços de outras criancinhas e de adultos. Posso? Não! Cerol não pode! Mas meu cachorro gosta de praia! Pode? Não, cachorro não pode!. Se ele gosta de água então leva o bicho para nadar na sua piscina, ou na sua banheira, ou na sua caixa d`água!. Na “sua”, e não na do público! Você vai fazê-lo feliz e não vai incomodar ninguém! O que é um choque? É algo repentino que faz você ficar "ligado". Mas o que precisamos - realmente - é de educação comum de como usar os ambientes coletivos, respeitando os interesses múltiplos. Se o carioca ama tanto a praia, por que então deixa sua sujeira nela? Já vi gente dizer: adoro o meu carro! Mas. quando você entra no carro dele, é uma tremenda sujeira! Incoerência? Não: é acomodação! Depois eu limpo! Depois eu lavo! Depois, depois, depois. Depois a galinha pôs um ovo para nós dois! E vamos nós acumulando irresponsabilidades, incoerências, desordens e ilegalidades. Choque pode parecer um tanto forte, mas sabe de uma coisa: é bom que alguém nos dê uma sacudidela para nos fazer perceber – já que não fazemos isso espontaneamente –, que vivemos em sociedade, em grupos, em aglomerações. Mesmo que queiramos botar na nossa mala tudo que nos dê satisfação e atenda aos nossos desejos, ela tem um espaço a ser respeitado. Existem regras para arrumá-la de modo mais útil e coerente. Da próxima vez que estiver num espaço público, lembre-se que ele não é a sua mala particular. Reflita que até mesmo a sua própria mala tem limites, e que você não pode colocar nela tudo o que deseja. E sobre a capacidade de carga do título? Existem diferentes interesses envolvidos com a capacidade de suporte de uma região. Se falarmos em planejamento de turismo, a aplicação estará voltada para identificar qual o número ideal de usuários que uma dada localidade comporta sem depreciar o seu patrimônio. Ela pretende controlar fluxos e interesses, especialmente os que ocorrem em áreas naturais. Não são estáticas, mas devem se adaptar a cada estação ou momento, que venha ameaçar a estabilidade do sistema, seja por motivos sociais, econômicos, políticos ou culturais. E voce? Já aprendeu a arrumar a sua mala?




Corredores ecológicos e seus serviços: abrigo, alimento, polinização, fluxo gênico, proteção de encostas, amenidade do clima e filtro atmosférico



Colaborador Roberto Rocha

Quem não conhece uma floresta? Pelo menos de reportagens na televisão você sabe que é um ecossistema cheio de ervas, arbustos, arvoretas e árvores. Certo? Não! Errado ! A floresta é um conjunto complexo - cheio de interações - a maioria delas ainda desconhecida. Dependendo do tipo de solo, do regime de chuvas, da temperatura e da umidade do ar, uma floresta pode ser mais rica ou mais pobre. A questão é que nos ensinaram que floresta é um conjunto de árvores de diferentes espécies, o que é uma definição muito acanhada e que não descreve corretamente o que ela realmente é, em sua variedade. Não existe floresta sem solo, sem água, sem animais que dispersam suas sementes, de polinizadores e tantos outros atores que vivem ali. A floresta é um enigma incrível! Quando falamos de “corredores” a idéia que surge é de “um caminho estreito que liga um ponto a outro ponto”. Será que serve para correr nele também? Fluir? Acho que fluxo é um bom termo, porque lembra fluxo de energia, fluxo de genes. Quanto mais relacionamentos, melhor. Não pode ser uma passarela de flores somente, como se fosse o resultado de um tratamento paisagístico. Na verdade os corredores ecológicos não são feitos para os humanos. Eles são feitos para os serviços dos ecossistemas. As águas do final de cada verão sempre causam transtornos relevantes. Enchentes, alagamentos, escorregamentos, mortes e prejuízos. Corredores devem tratar desses assuntos também. Não podemos separar impactos ambientais dos sociais. O homem já invadiu diversos ecossistemas naturais e não podemos desconhecer essas interferências. Os corredores também podem contribuir para segurar encostas e amenizar os rolamentos de matacões. As raízes de algumas figueiras ajudam a fixar pedras soltas e produzem uma incrível quantidade de frutos para os animais e para o homem. No magnífico livro Figueiras do Brasil, os autores Jorge Pedro Carauta e B. Ernani Diaz (Editora UFRJ, 2002) ressaltam: “as figueiras têm acompanhado o homem desde as primeiras civilizações na Mesopotâmia e no Egito e depois, mais tarde, nas civilizações grega, romana e judaica”. Existem espécies próprias para áreas urbanas e outras que só devem ser plantadas em parques, áreas degradadas e distantes de residências e estradas. Esses vegetais pertencem a família das Moraceas mas quantas outras famílias botânicas também atenção especial? Saúde deve subentender qualidade de vida para todos. Os corredores devem estar livres de produtos tóxicos para que não envenenem os organismos presentes. Do ponto de vista toxicológico é comum se estabelecer níveis de segurança para homens, mulheres e crianças. Potabilidade e balneabilidade: somente para o homem? E a potabilidade para as bactérias do solo? Para os fungos? Qualidade do ar: só para humanos? E para os liquens? E para as bromélias e orquídeas? Alguns animais são ainda chamados de “pragas” - como se eles tivessem alguma culpa de sua função reprodutiva e alimentar. Por causa de um, pagam milhares. Ao se pulverizar drogas químicas que matam “insetos indesejáveis”, os organismos polinizadores também morrem e deixam de prestar seus serviços ambientais. É realmente um crime ecológico. Já existem armadilhas onde fêmeas de mosquitos depositam seus ovos e dos quais saem suas larvas, ficando ali aprisionadas. É um excelente exemplo de “controle biológico” sem prejudicar o sistema como um todo. Enfim, porque estamos falando de tudo isso se o assunto é corredor florestal? A explicação é a seguinte: a implantação de corredores deve ser orientado do ponto de vista “ecológico” e não exatamente paisagístico. No outro dia, soube da existência de duas espécies de árvores (Lauraceae) conhecidas como maçaranduba - Manilkara elata e Manilkara longifolia - do Rio de Janeiro, e que quase ninguém conhece. Se fala muito da maçaranduba da Amazônia mas nada sobre a do Rio de Janeiro. E o tapinhoã (Mezilaurus navalium)? Você já ouviu falar? Pois é, essas espécies poderiam ser mais valorizadas, como tantas outras completamente desconhecidas de nossas próprias terras e estados próximos. Diversificar é a palavra! De preferência usando espécies cujos frutos sejam dispersados por animais. Eles trabalham sistematicamente fazendo esse serviço ambiental de espalhar sementes. Não cobram nada por seus préstimos. É só dar a eles a chance de freqüentar esses ambientes florestais, próximos uns dos outros. Os corredores florestais devem ser caminhos de vida. Quanto mais complexo o corredor, mais útil e funcional ele será. Mais serviços prestará. Conter encostas, filtrar o ar, alimentar animais, amenizar o clima e tantas outras vantagens. Devemos sim prestigiar os corredores ecológicos, enriquecendo-os com o maior número possível de formas biológicas. Corredores de bactérias, corredores de fungos, corredores de cupins, corredores de formigas, corredores de lagartas e de borboletas, de aranhas, e tantos outros organismos, muito mais do que simplesmente de plantas verdes...

O jogo da Terra


Colaborador Roberto Rocha

A reunião era para anunciar a proposta de um grande jogo para poderosos. Estavam presentes representantes dos governos, empresários, religiosos, sindicatos, entre outros. As regras eram as seguintes: a) ninguém poderia sair do jogo até o final; b) era preciso que cada jogador respeitasse o outro; c) não haveria vencedores: os jogadores estavam ali para compartilhar experiências e praticar suas habilidades; d) todas as vezes que alguém tivesse alguma vantagem de pontos ele seria reconhecido, mas teria que dividir o que ganhou com os demais. Logo que foram anunciadas as regras, começaram os comentários: e se eu precisar sair para resolver um negócio importante? E se alguém ofender a minha mãe? Não gostei muito desse papo de trocar experiências! Imagine! Ter queimado meus neurônios durante anos seguidos e depois ficar dando luz para cego! Pior ainda, conseguir uma vantagem e depois dividir com os outros! Que absurdo! Não estou gostando nada disso! Quando os ânimos já estavam exaltados, alguém falou: senhores! O jogo ainda nem começou e vocês já quebraram todas as regras propostas. Realmente não podemos começar nada com esse clima! Um dos convidados, muito bem vestido, perguntou: Afinal, que jogo é esse que não tem vencedor? O anfitrião explicou: joga-se com cartas que representam valores humanos, consagrados pelos filósofos gregos clássicos, desde a antiguidade; e não exatamente os valores econômicos. Compreendo o espanto de todos, porque fomos “educados” nos últimos séculos a pensar somente nos lucros financeiros. Como todos sabem, muitas coisas do passado foram depois reconhecidas como graves erros e equívocos lamentáveis. Mas se vocês desejam realmente algum tipo de prêmio eu tenho aqui, nesta caixa dourada, uma carta que representa um poder jamais visto e que é, realmente, quem controla todos os demais poderes humanos. Todos pararam de discutir por alguns segundos. E um dos candidatos ao jogo, perguntou? E que carta é essa, tão poderosa assim? O anfitrião respondeu: é a Carta da Terra! Nela está desenhado um planeta azul e limpo onde é possível conviver de modo equilibrado; cujas regras existem há bilhões de anos e continuam a funcionar até hoje, ajustando e corrigindo os erros e desrespeitos humanos que temos cometido, em especial, nos últimos séculos. Um outro pretenso jogador disse: mas isso não tem valor comercial! E também não se pode ganhar dinheiro sem causar danos socioambientais! O anfitrião, outra vez, respondeu: Pois bem meus senhores! Essa é a proposta do jogo para o qual foram convidados! Não será nada fácil fazer com que as pessoas se respeitem considerando a diversidade cultural que temos aqui! Também não será fácil discutir valores éticos que suplantem os interesses econômicos imediatistas! Nada será fácil!... Mas o que queriam os senhores, afinal? Um joguinho sem graça? Sem dificuldades? Sem emoções? Sem decepções? Onde está o espírito de luta do qual tanto falam? Só lutam por dinheiro? Metais e papéis? É isso? Por que a realização de cada um não pode estar acompanhada por uma visão mais ampla de mundo? Com equidade? Com a valorização e o uso racional dos serviços ambientais? Com maiores investimentos na preservação de ecossistemas que já estão mais do que espoliados, por exemplo, os oceanos? Podemos investir mais nessa direção! Não se trata, definitivamente, de uma questão ecológica e ingênua. Ela é muito mais econômica do que se pensa! Pode gerar prosperidade ou prejuízos incalculáveis! Senhores: eu os convido a jogar! Mudanças sempre assustam. Mas eu nunca vi um mundo mais assustado como esse que eu vivo agora! Acho que já deveríamos ter mudado há muito tempo! Esse é um bom momento: vamos jogar?...

Áreas desprotegidas: reserva ilegal e áreas de preservação eventuais


Colaborador Roberto Rocha
O aluno perguntou para a professora o que era uma Área de Preservação Permanente (APP). Ela disse que era uma área para “preservar a natureza”. O aluno continuou: mas por que é preciso preservar a natureza? Porque a natureza nos presta serviços que valem muito dinheiro e pelos quais nós não pagamos absolutamente nada. Imagine se todos dependessem apenas do dinheiro para poder viver! E o garoto, outra vez: mas não é assim? Se eu não tiver dinheiro no bolso eu não posso comprar a minha merenda! Minha mãe não pode fazer compras no mercado! Meu pai não pode pagar a passagem do trem e do ônibus! Eu não entendi! Pois é, muita gente não entende. Pensa que economia é assunto ligado exclusivamente à geração de empregos, construir estradas e ferrovias, comprar eletrodomésticos etc. Mas se os serviços ambientais deixarem de existir, tudo isso que você vê funcionar, pára. Nada mais acontecerá! E não haverá dinheiro suficiente para substituir “pagando”, todos esses “serviços naturais”. Mesmo pedindo empréstimos ao mundo inteiro. É impossível sobreviver sem os serviços ambientais! O menino ficou mais curioso ainda: então nós dependemos de algo que trabalha de graça para nós, o tempo inteiro? Sim, respondeu a professora. O menino: e quem faz isso? A natureza, ora! Você paga para uma empresa levar a água até a sua casa, mas quem faz circular água na Terra é a natureza! Imagine ter que transportar toda aquela água desde as nascentes até a estação de tratamento? Quem faz isso? O menino: a natureza? A professora: é, a natureza! O menino estava impressionado! Mas por que então ninguém fala sobre algo tão importante nos jornais das televisões e nos programas em geral? As escolas deveriam falar desses serviços em todos os níveis de ensino! O menino estava revoltado! A professora, mais uma vez, explicou: tem gente que fala, mas as pessoas não percebem, porque esses serviços não têm um sistema de propaganda e marketing a favor deles. Você já viu alguém fazendo propaganda sobre a formação das nuvens no céu? Ou elogiando uma mosca que poliniza um fruto? Ninguém faz isso! Aí, você entende porque essa discussão sobre reserva legal e áreas de preservação permanente continua tão confusa. As pessoas só raciocinam com base na “cadeia produtiva” compreendida como “ganhar dinheiro” ou ainda, “perder dinheiro”. Não conseguem ver que a preservação da natureza gera lucro, evita prejuízos imensos, melhora a saúde física e mental. Tudo isso “é lucro”. O menino estava triste: quer dizer então que a maioria das pessoas só pensa em termos de dinheiro? Exato! É isso mesmo. Não temos uma cultura que valorize a preservação da natureza como a mais importante fonte de “lucros”. O que temos é a exploração da natureza como fonte de lucro: você entendeu onde está o problema? Agora entendi, respondeu a criança. Mas como mudar isso, perguntou o aluno? A professora: depende primeiro da percepção de cada um sobre a importância desses serviços. Depois a legislação precisa colocar isso como prioridade. Veja que uma simples mudança climática regional – como a que acontece agora no Nordeste, em Alagoas e em Pernambuco - trás um mundo de perdas inestimáveis. Os municípios vão gastar fortunas para reconstruir as cidades. Tudo isso sinaliza para nós como alertas. Mas se não ouvimos os alertas, tudo continua como antes. As pessoas continuam a construir suas casas nas margens dos rios e nas encostas; desmatam as nascentes, e assim vai. É claro que a natureza vai pegar de volta os seus espaços, mais cedo ou mais tarde. Se sabemos disso, não deveríamos permitir essas ocupações indevidas. E nem mesmo a ocupação de grandes espaços com monoculturas e gado. Isso não é natural para o nosso país. Aqui deveríamos cultivar e criar plantas e bichos daqui mesmo, evitando o desmatamento insustentável. A soja é da China, o boi é europeu ou indiano. São exóticos. Tudo estrangeiro. A questão é que nós aumentamos tanto as áreas para criar bichos e plantas de outras países, que agora estamos avançando nas áreas das plantas e dos bichos que são nossos. Não estamos investindo em aproveitar esse potencial nativo porque custa caro e não atende às demandas do momento. É uma questão de estratégia comercial. É isso que é considerado como prioridade. Poderíamos até não ser radicais e tentar fazer as duas coisas ao mesmo tempo, mas muita gente não concorda com isso. É isso, minha criança! Temos a esperança que outros meninos preocupados como você, possam ser os empresários de amanhã. Que possam ser empreendedores também. Mas a partir de outro paradigma - que não seja o atual - altamente lucrativo, mas completamente desconectado da precaução e da coerência de cooperação mútua com os nossos próprios recursos, nossa biodiversidade, nosso futuro econômico. A questão principal é que o povo brasileiro é hoje formado por diferentes culturas; e cada uma tem lembranças distantes, que nem sempre combinam com as lembranças indígenas originais, em grande parte ausentes dos assuntos do momento. Os índios brasileiros possuíam uma sabedoria milenar de uso dos ecossistemas da terra, perfeitamente coerente com sua conservação permanente. Basta lembrar a incrível cobertura vegetal do Brasil na época da invasão portuguesa. Após cerca de 500 anos, podemos perceber o que aconteceu. Como já disse há algum tempo: não vamos voltar a usar arco e flecha, ou andar “pelados” por aí. A questão é refletir sobre questões ecológicas e evolutivas associadas às questões econômicas e fazer disso um novo caminho de “desenvolvimento” sem que sejam destruídos os nossos mais importante aliados: os serviços ambientais.

Áreas protegidas : bancos genéticos como solução imediata para a recuperação da insensata devastação florestal brasileira


Colaborador Roberto Rocha

Desde que li o livro “A ferro e fogo” (Companhia das Letras, 1996) de Warren Dean, professor de história na Universidade de Nova York - falecido em 1994 num trágico acidente em Santiago do Chile – tive certeza de que realmente fomos insensatos quando devastamos, durante séculos, a nossa rica biodiversidade brasileira. A epígrafe do livro traduz bem esse clima: “Quem vier depois, que se arranje”. Estimulados e convencidos de que “arrasar” a mata era a solução mais rápida de fazer dinheiro, nos esquecemos que estávamos num país tropical, onde não existe gelo e ameaças de fome, durante meses críticos. Uma bacia hidrográfica pululante de vida aquática, um litoral interminável de frente para um incomensurável oceano, terras ricas protegidas por uma megadiversidade invejável, jamais reconheceriam um ser desnutrido ou infeliz. A robustez de nossos índios “selvagens” atestam a riqueza da terra. A estratégia européia de plantar e colher, com suas próprias mãos, quase tudo de que necessita, não se parece com a milenar cultura de coleta natural de tudo que a floresta oferece sem qualquer custo adicional. Esse equívoco ecológico centenário nos transformou num dos mais vorazes predadores de florestas da atualidade seculovinteana. Hoje, em pleno século XXI, algumas pequenas luzes começam a reconhecer a importância econômica dos serviços dos ecossistemas.

Já afirmamos, por diversas vezes, a ponto de nos tornarmos repetitivos, que não se trata apenas de questões ecológicas e sentimentais que estão sempre envolvidas nesses embates. É sim, pura necessidade de bem-estar material e mental para as futuras gerações. Não é um cenário para as gerações de idosos da atualidade porque muitos deles não verão os frutos das mudas e sementes que estão sendo plantadas hoje, mas seus netos poderão conhecê-las. Eu, que fui avô recentemente, fico imaginando: quando será que minha neta poderá admirar uma frondosa castanheira ou um jequitibá esplendoroso, plantados agora, ainda de muda ou de semente?. Quantos anos se passarão - para que como ela -, cresçam fortes e cumpram o seu papel no mundo?

Um dos passos nesse sentido é a recuperação de áreas degradadas das margens dos rios, onde viceja a mata ciliar. Essas áreas específicas evitam a perda de solo e “cuidam” da qualidade e da quantidade de água a ser usada de diversas formas. Interferem numa infinidade de processos físicos, químicos e biológicos que nos trazem satisfações e confortos e garantem que os ecossistemas possam funcionar perfeitamente.

A percepção da importância desses serviços ambientais da natureza pode permitir que a própria tecnologia que dissemina as monoculturas, se volte para corrigir seus erros e equívocos do passado, numa tentativa de convivência mais equilibrada, como manda o bom senso econômico. As cercas com arames não são investimentos “caros” para afastar o gado, como costumam dizer. É antes, interessante meio de “produzir” água, novas sementes, revigorar a fauna, enriquecer o solo, prevenir erosão, conter enchentes, entre outras. Trata-se de investir em ”água” – um grande negócio!. Sem água não há chances de criar nada! Mesmo que você tenha milhares de dólares, eles não farão retornar a água de uma hora para outra. Isso leva algum tempo. E como dizem os economistas: tempo é dinheiro! Então, se não desejarmos perder dinheiro com tempo perdido, devemos aproveitá-lo com algumas medidas que trarão de volta o dinheiro, futuramente.

As áreas protegidas do Brasil - como as áreas indígenas, reservas legais, áreas de preservação permanentes e unidades de conservação - são indispensáveis bancos genéticos de sementes que valem fortunas quando estão transformados em imponentes árvores, cumprindo cada uma os seus respectivos papéis ecológicos.

O papel das áreas indígenas é decisório nesse momento em que temos grandes áreas desmatadas por monocultura e pecuária, necessitando de recuperação no Brasil. Florestas são “fábricas de sementes e mudas” que o mercado está precisando. Os próprios índios serão empresários de suas próprias “reservas econômicas” fornecendo esse material para um mercado que vai crescer rapidamente nos próximos anos. Reservas legais, áreas de preservação permanentes e unidades de conservação podem se transformar em grandes negócios ecológicos, de aceitação pública imediata. Produzir mudas e sementes em hortos municipais, com recursos públicos, também é uma idéia antiga, mas que não existe como realidade na maioria dos milhares de municípios do Brasil. Assim como é possível fazer com o tratamento de resíduos sólidos em “consórcios”, é possível atuar em viveiros de produção de mudas unindo secretarias próximas de áreas protegidas. Vai ser preciso investir em capacitação de pessoal e gerar mais empregos nessa área, prestigiando as profissões envolvidas nesse trabalho. Mais do que um exemplo internacional – os jogos olímpicos estão bem próximos – poderemos construir um modelo de produção comprometido com uma visão que entende a necessidade da existência da complexificação ecológica como a verdadeira fonte lucrativa que alimenta os nossos processos históricos de economia, baseados numa simplificação pragmática e exclusivista.

Perdas e danos: quanto valem os serviços ambientais da Terra?


Colaborador Roberto Rocha


O vazamento do Golfo do México – e quantos mais virão? – nos mostra o quanto somos tremendamente vulneráveis, numa realidade tecnológica bem intencionada, mas que - na prática - não apresenta o mesmo excelente desempenho de suas prospecções e na resolução de seus enfrentamentos mais graves. Afinal, qual o valor da natureza? Voltamos à antiga pergunta que sempre fizemos: quanto vale um mangangá? Aquele inseto polinizador - como tantos outros – que voam de flor em flor, para garantir uma colheita farta de alimentos que ocupam nossas mesas na forma de grãos, doces, sucos, refrescos ou simplesmente ao natural? Não sabemos, ou não queremos discutir essas questões subjetivas e complexas?. Qual o preço do metro quadrado de um manguezal poluído? Você sabe? Com certeza, não sabe. Nem eu! Mas sabemos quanto custa o metro quadrado imobiliário na zona sul de qualquer município! Por que não aplicamos cálculos para saber quanto valem os serviços ambientais da natureza? Poderíamos calcular a quantidade média de zooplâncton ou fitoplâncton por metro cúbico afetado! Depois calcularíamos a quantidade em peso vivo desses organismos em um ano, em dois anos, em três anos etc. Aplicaríamos o valor de mercado? Em reais? Em dólares? Em euros? E a depreciação? Por exemplo: uma larva de camarão “lixo” custaria o mesmo que um camarão VG? Além dos valores de cada espécie, deveríamos descontar a taxa de mortalidade media de cada uma delas e aplicaríamos um fator de correção?. Somaríamos a tudo isso os valores que esses organismos representam para a manutenção da cadeia alimentar dos ambientes marinhos e de águas doces, sem qualquer uso humano direto?. Acrescentaríamos ainda o valor desse pescado para as comunidades ribeirinhas e litorâneas que pescam “de graça” todos esses “recursos naturais”?. Valor ecológico-social? Questões turísticas estariam também envolvidas: gastronomia, pesca esportiva e todas as cadeias dependentes dessas atividades associadas aos frutos dos mares e rios. Difícil? As empresas seguradoras devem ter alguma resposta. Somos guiados por cálculos lineares que não funcionam em situações de redes complexas. Apresentamos soluções reducionistas para desafios sistêmicos. Isso é um absurdo! É inconcebível! O maior desafio é mudar o paradigma para se tentar apresentar soluções coerentes. A pergunta é: QUEM QUER MUDAR O PARADIGMA? QUEM PODE MUDÁ-LO? Que argumentos teríamos para tal propósito? Você tem alguma sugestão? A hegemonia pensante linear não nos deixa raciocinar de forma sistêmica! Você faz parte da rede tanto como a larva de camarão morta pelos impactos das atividades humanas! Dizem que somos uma espécie que pensa. Pensa o quê? Não estamos falando de “defender a natureza” – um posicionamento muito ingênuo! Estamos falando de economia pesada, de segurança alimentar, de grandes investimentos afetados por questões ecológicas. Por quanto tampo ainda vamos continuar a desconhecer o valor econômico dos serviços ambientais?

Novo caminho: homem como meio, ambiente como fim !


Colaborador Roberto Rocha

Temos apresentado alguns argumentos que colocam o homem como criatura secundária no Todo. Para tal, precisamos aceitar uma verdade: o ambiente é fim, e não meio. Devemos aceitar que  "não somos divinos sozinhos". É razoável sustentar que representamos criaturas especiais, pelo fato de podermos conceber a nós mesmos e aos "outros". Mas também,  não sabemos - exatamente - como esses "outros" nos percebem! Conjecturamos que sejam irracionais; que não pensam. Mas o que é pensar? O que é perceber-se? Qual a real utilidade dessas "definições"? O que tem sido o pensamento do homem? Até onde tem valido nossa apurada percepção diferenciada no sentido de nos transformar em criaturas melhores? Se somos especiais deveríamos ser algo bom e justo. E o que é ser bom e justo? Bom com quem. Justo, em que medida e para quem? É nesse momento que entra a observação. A contemplação no sentido de admiração da perfeição. Não é questão religiosa específica porque a própria religião parece seguir este mesmo caminho. Ele já existia antes: a percepção do Todo como algo inteligente, porém indecifrável... Na espiral do tempo e do conhecimento, já demos muitas voltas. Parece que, a cada dia, ela se alarga de modo ascendente, mas sempre de encurva e retorna, indefinidamente. 

Agora, uma grande revelação: não fomos nós que começados tudo isso! 

O homem - parecido com o que somos hoje - só apareceu no cenário terrestre há uns 250 mil anos. Outros hominídeos existiram antes dele. Mas qual seria o "objetivo" de estarmos aqui? Construir alguma coisa especial? Não sei dizer. No entanto, não acho que tenha sido para apenas destruir. Talvez, reinventar. É isso: somos reinventores de coisas divinas!. Eternos curiosos e insatisfeitos. Ou insatisfeitos curiosos. Juramos amar o mundo, mas fazemos coisas que não são amáveis com ele. Incorporamos a equivocada certeza de que "somos especiais". Que devemos transformar e dominar o planeta. Talvez, a questão não esteja no ímpeto da transformação ou do domínio, mas no seu objeto. Devemos dominar sim, o nosso orgulho. Devemos transformar sim, o nosso universo interior. O grande desafio para o século XXI é este. Teremos que reunir a todos. Não separar aquele que grita mais para aparecer, porque isso é discriminação. Melhor, estimular para que "todos" apareçam ao mesmo tempo. Que todos gritem quando for hora de gritar. Que todos silenciem quando for hora de silenciar, assim como fazem os animais. Não que haja alguém com uma batuta na mão a sinalizar o que fazer. Mas pela força de algo que vem de dentro e não depende de nenhuma orientação externa, radical, imposta. Que venha do coração! O tumulto contínuo em nossa volta não nos deixa observar e perceber coisas distantes, às vezes muito distantes, mas não menos importantes. Algumas estão tão distante que nos perdemos delas, e quase não as reconhecemos. Quanto mais rapidamente obtivermos esta compreensão, mais chances teremos de reconhecer o "outro" como irmão  de uma mesma família, mas não como um inimigo, e também, não necessariamente da nossa mesma espécie, perigoso, ameaçador, exaltado, excluído.

Fonte de imagem: Fundação Museu do Homem Americano. Piauí, Brasil.
Conheça. visite, prestigie: Disponível em: http://www.fumdham.org.br/

Buscando um planeta sustentável: a procura ingênua do que sempre existiu, antes mesmo da existência humana.

 Colaborador Roberto Rocha


Palmito juçara (Euterpe edulis)
    Reuniões e mais reuniões enchem as agendas nacionais e internacionais com compromissos para discutir temas que ainda carecem de conhecimentos básicos. Planejamentos em cima de dados biológicos ainda não perfeitamente coletados: não sabemos quantas espécies existem no planeta. E menos ainda: como elas se relacionam? Mas estamos falando de sustentabilidade! Tá certo! Pelo menos, estamos falando no assunto! Como também estamos falando de biodiversidade. Está virando moda!. O perigo é que as "modas" vivem mudando a cada estação. Compreender e praticar a sustentabilidade passa por reconhecer a supremacia e coerência de uma organização  que vem se sustentando há milhões e milhões de anos sem a nossa "boa intenção de ajudar". A discussão é muito antiga, de quando nós - Homo sapiens - estávamos ainda na forma de criaturas estranhas, protoconcebidas para o contexto da época.


Não tínhamos a percepção nem a preocupação com as questões climáticas atuais. Imagine: o homem  querendo controlar o clima!?  Que coisa mais simplória! Não somos capazes de prever - com  precisão, a nível municipal  -, nem mesmo a ocorrência de uma geada!. Bolas de gelo do tamanho de um ovo de galinha podem furar nossos telhados e apedrejar as plantações arbustivas tradicionais e exóticas (estranhas ao país) a nos punir por algum pecado inominável. Quem aguenta!  Como prever o que vai acontecer com o planeta? Dois graus? Três? Quatro? Conhecimentos técnicos e científicos de boa qualidade são necessários para melhorar a nossa compreensão. Formação de bons professores e estruturação de redes idôneas de informações são indispensáveis.

A propósito, a Agencia FAPESP - (Disponível em: http://www.agencia.fapesp.br/. Acesso em: 3 dez.2010) -  está destacando a oportunidade de acesso livre a milhares de obras, artigos, mapas e documentos históricos sobre a biodiversidade brasileira, contando agora com o Portal BHL ScieLO.  O consórcio "Biodiversiry Heritage Library" - (Disponível em: http://www.biodiversitylibrary.org/.) -  reúne os maiores museus de história natural e bibliotecas de botânica no mundo, como a Academy of Natural Sciences e o American Museum of Natural History, nos Estados Unidos, e o Natural History Museum, na Inglaterra.

 Embora as informações estejam disponíveis, uma parte da população ainda permenece sem saber ler e escrever e esse tipo de conteúdo não faz parte de sua realidade imediata, embora assim o seja.  Enfrentamos enormes obstáculos pelo elevado número de analfabetos no mundo. Até 2015  existe o compromisso firmado por 191 Estados-Membro das Nações Unidas (ONU)  para  "resolver" oito grandes desafios do planeta: os objetivos do milênio. Um deles - atingir o ensino básico universal - continua sendo apenas uma esperança. O próprio Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), reconhece:  " houve progressos no aumento do número de crianças frequentando as escolas nos países em desenvolvimento. As matrículas no ensino básico cresceram de 80% em 1991 para 88% em 2005. Mesmo assim, mais de 100 milhões de crianças em idade escolar continuam fora da escola. A maioria são meninas que vivem no sul da Ásia e na África Subsaariana. Na América Latina e no Caribe, segundo o Unicef, crianças fora da escola somam 4,1 milhões" (Disponível em: http://www.pnud.org.br/odm. Acesso em: 3 de dez. 2010). E uma frase aparece em todo lugar, que também nós endossamos: faça a sua parte! Mas fica a pergunta: que qualidade terá a minha parte para decidir assuntos tão complexos?

Como discutir biodiversidade e sustentabilidade quando esses assuntos não são prioridades dentro das salas de aula?  Poucas pessoas sabem o que são "serviços ambientais ou serviços ecossistêmicos"! Se uma boa parte da população não sabe ler ou interpretar um texto simples, como compreender e participar de discussões mais complicadas que exigem um mínimo de conhecimentos gerais ? O que você vê na midia: sustentabilidade?. Biodiversidade? Os temas explorados tratam de realidades próximas do indivíduo; que tenham relação com medo e prazer: assalto, bala perdida, sexo, futebol, roupas bonitas, carros de luxo. E reclamam de Copenhague (Dinamarca, 2009), de Cancún (México, 2010), e tantas outras que virão.

Faça a sua parte! Tudo bem.! Mas precisamos divulgar a nível popular, também as questões mais complexas que ainda não fazem parte das discussões mundanas. 

A imprensa pode ajudar sim, por um lado, ampliando as horas dedicadas aos temas biodiversidade e sustentabilidade.  O governo - necessariamente - poderá oferecer melhores condições de ensino, contando com melhores equipamentos e oferecendo capacitação remunerada para os professores. Esses passos serão importantes - não para resolver exatamente as questões ambientais do mundo - mas para reconhecermos qual o  nosso real papel socioambiental nesse cenário do século XXI; tão complexo, no qual somos estreantes, ainda muito pouco experientes...

O homem ambientalista e conservacionista: um discurso desgastado?


Colaborador Roberto Rocha

A ano de 2010 foi consagrado como Ano da Biodiversidade, com suas espécies, paisagens e infinitas formas de expressão genética.  Uma tentativa para chamar a atenção de todos para o óbvio: “não há sistema econômico, nem social, nem cultural, que resista sem a fundamental e decisiva participação dos serviços ecossistêmicos”. Sem a preservação dos serviços da natureza não há civilização que se sustente por muito tempo. A saúde humana depende da saúde ambiental. Os "planos de saúde" - numa visão mais atualizada do que seja "saúde" - deveriam garantir também água potável, ar puro, moradia, saúde mental e tantos outros fatores para quem recebe seus serviços. Estamos ainda presos à conceitos retrógrados  que continuam a nos dizer que saúde, prioritáriamente,  é "não ter doença infecciosa".

Os hominídeos sempre foram testados a partir de seus potenciais bióticos desde a pré-história, no Período Paleolítico. Somos hoje - o Homo sapiens - resultado genético e único, do que foi inteligentemente selecionado pela resistência ambiental dos biomas terrestres do passado remoto. Das dezenas de espécies de  "homens primitivos", só nós conseguimos chegar até o momento recente. Talvez tenhamos nos entusiasmados demasiadamente com a domesticação dos animais, que ensejou a pecuária; e com o cultivo de vegetais - que estabeleceu a agricultura - e mais tarde, viria a ser manipulada pelo agronegócio em nível mega, devastador.

A descoberta da escrita, da fundição dos metais e a construção de cidades, sacramentaram a história humana com um modelo consumista que se tornou hegemônico. Meio tímido em seu início, viria – por força das máquinas – a se tornar um paradigma de sucesso econômico de curto prazo, embora desastroso no tempo ecológico.

E o que os ambientalistas têm a ver com isso? A explicação seria a seguinte: economistas e ecologistas não se falam. Motivo: incompatibilidade de interesses! Os primeiros – os economistas, com exceções, é claro - defendem o lucro e o desenvolvimento a qualquer custo, desconhecendo os serviços ambientais como “gerenciadores mais nobres”. Os recursos naturais “são para uso do homem”. A questão é bíblica: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Tenha ele domínio sobre os animais marinhos, sobre as aves, sobre os animais domésticos e sobre os répteis. Domine a terra toda”. Se compreendermos a profunda influência religiosa em nossas vidas - até por motivos subjetivos - é possível explicar porque não temos uma índole “conservacionista”. Ou ainda: quem sabe a determinação “domínio sobre os animais [...]” seria com a intenção de “usá-los racionalmente”?

Os interesses mais comuns estão centrados em “indivíduos e espécies”; e não exatamente nos “ecossistemas”. Quando se começou a falar em “proteger” baleias e micos, o que realmente estaria por trás de tudo, seriam os ecossistemas: marinhos e florestais, nesses casos. Algumas espécies são exaltadas como “bandeiras” porque são rapidamente reconhecidas, quando torna-se necessário estabelecer prioridades. Elas ficam mais visíveis e chamam a atenção, como faziam as "bandeiras" das guerras antigas e medievais. Se já é difícil para o leigo, entender o papel de uma espécie num ecossistema, imagine entender “todo” o ecossistema? Nós não fomos “formados” para pensar em rede.

A separação homem-natureza foi um grande êrro. Nossa percepção do “todo” foi suplantada pela percepção das partes: aquelas que nos ofereciam vantagens imediatas; e esse vício, continua até hoje. Se desejarmos realmente nos tornarmos “ambientalistas” – como o nome sugere, numa visão mais ampla e complexa - deveremos deixar de ser “simplistas”, combatendo a depredação ecológica, verdadeiro “cancro” para um desenvolvimento sustentável ou para a sustentabilidade de longo prazo, como querem os mais recentes pensadores.
Não podemos pensar em desafios humanos tais como educação, segurança, saúde, trabalho, transporte e tantos outros, sem considerar os ecossistemas como agentes mais importantes de qualquer processo antropológico que se deseje incrementar.

O homem “pensa que domina”, mas “ele não controla”, ele é controlado. Se tivéssemos evitado esse equívoco milenar, certamente estaríamos agora investindo bem mais numa educação que nos levasse  a compreender melhor a nossa dependência natural dos ecossistemas e não exatamente como explorá-la de modo devastador. Nossa educação deve seguir no sentido ecológico e de complexificação,  porque a natureza sempre age de forma multicooperativa, enquanto o homem atua de forma egoística e simplificadora.

Precisamos pensar como indivíduos de uma espécie que faz parte de um contexto; e não que pretenda "dominar" esse mesmo  contexto. O ambientalismo deve considerar este aspecto. A conservação consiste em aprendermos nas escolas e na vida, como funcionam os sistemas naturais e não somente como funcionam os sistemas econômicos predatórios.

O núcleo deve ser a família e a cidade deve ser a complementação. O homem é também um primata, essencialmente social.  A base de um primata é a sua família, seu referencial. Sem ela, permanece perdido e desorientado. As famílias formam os grupos; não são os grupos que formam as famílias. Se invertermos os papéis estaremos negando toda uma história antropológica de  muitos milhões de anos. É absurdo desejar apagar em alguns séculos o que construímos e incorporamos em nossos gens durante milhares e milhares de anos. Zelar pelo manutenção dos serviços dos ecossistemas é apenas uma questão de bom senso.