sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Os idosos e o tempo


Colaborador: Roberto Rocha

A preocupação com o tempo sempre esteve presente em nossas vidas. Usamos os segundos, os minutos, as horas, os dias, os anos, etc. Tudo perfeitamente convencionado. Se é uma convenção humana, certamente é falha, mesmo com toda a tecnologia atual. Não sabemos tudo. Justamente por isso, não devemos afirmar que o que fazemos está exatamente correto. Essa limitação se mantém através de um sistema que privilegia a sua aplicação para atender os nossos interesses mais urgentes: estou atrasado! Tenho uma reunião às 10! A barca sai às duas horas! Você chegou cedo demais! Estou ficando velho! E assim vai. O tempo para os neonatos é uma "mamada" e a boca cheia de leite!. O tempo para os infantes é explorar o entorno, um tanto  inseguro, mas sabendo que pode correr para os braços da mamãe se algo for muito "assustador"! O tempo para os jovens, é lidar com seus hormônios em meio a uma série de dúvidas em relação ao futuro. Os adultos esperam do tempo alguma recompensa mais duradoura. Os idosos já se acostumaram com o tempo e não guardam tantos sonhos mirabolantes, e procuram estabelecer na vida, um padrão compatível com as suas estruturas físicas, psicológicas e econômicas. Mas o tempo também passa para as plantas, para os animais, para os rios, para os lagos, para as cidades, para os prédios. A diferença está em que, nos humanos, existe uma percepção mais imediata dos sinais e sintomas do tempo. Mas como avaliar e interferir nos sintomas do envelhecimento das cidades? Quando passo pelo centro do Rio de Janeiro, vejo algumas datas nos topos dos prédios, muitas delas, do inicio do século XX. Mas que diabo! Já estamos no século XXI! Como tudo passou tão rápido? Já sou "sênior"! Os prédios deveriam ter também  uma carteira de "idoso", devidamente cadastrados e mapeados na cidade. Onde será que eles são mais comuns? Com que material foram construídos? Será que a assistência deles é igual a dos idosos humanos? São respeitados? Fazem exames periódicos com seus especialistas? Recebem assistência de qualidade? Fazem plástica? Tiram os excessos e corrigem as cicatrizes? Quantos "predidosos" você já viu pela cidade? Será que eles sofrem de osteoporose? Ficam com suas estruturas frágeis e corroídas? Tomam cálcio e vitaminada D3 profilaticamente? É verdade que os idosos estão cada vez mais bem atendidos. O Brasil será, dentro em breve, um país de idosos. Mas não somente de idosos humanos. Será um país de prédios antigos, a maioria nas grandes cidades, sem grande histórias, diferentemente do que aconteceu na Europa. Não foram construídos na Idade Antiga ou na Idade Média. São "velhinhos" quase contemporâneos, ilustres desconhecidos! Embora sejamos um país europeizado por excelência, guardamos também raízes africanas exóticas, com influencias em nossas danças, comidas, vocabulário, etc. Nossos indígenas também não faziam construções para durar um século. Os humanos da pré-histórias viviam muito pouco. Apenas o tempo para reproduzirem e criarem alguns descendentes. Suas construções eram também de pouca duração. Com as novas tecnologias aprendemos a viver mais: nós e os prédios. No entanto, sem prevenção, estaremos todos vulneráveis. Nós, os "humanidosos" e também os  "predidosos". Já não consigo pular como no passado. As estruturas estão afetadas. Com algum trato ainda posso "durar" um pouco mais. E o que dizer das construções que já têm mais de 100 anos? Os prédios são muito semelhantes aos humanos. Eu ainda não tinha percebido isso! Mas repare só: um prédio com oitenta anos e um idoso com a mesma idade? Vejam os neonatos, infantes e jovens prédios "crescendo" no meio dos adultos e dos antigos! Será que têm algo a aprender? O que fazer com os prédios que vão morrer? Terão um enterro digno? Algum epitáfio marcante? Serão reconhecidos? Eles, os prédios;  e nós, os humanos. Quem sabe uma estátua de material sem valor econômico? Com o tempo, o que restará serão apenas registros fotográficos, em algum álbum de família ou museu histórico. E aquele clássico comentário esse "austero bigodudo" aqui, era o seu bisavô! Essa mulher "recatada", era a sua bisavó! O que dizer dos prédios "austeros" e das construções "recatadas"? Ao observar as obras de arte dos prédios antigos e os tijolos unidos com óleo de baleia, não deixo de sentir alguma nostalgia. O aço especial talvez não venha a sofrer tanto com a corrosão interna. Não precisamos mais, matar baleias para iluminar as cidades e construir novas edificações. No entanto, fica a preocupação: o que fazer com os "predidosos"? Que solução mágica - seja ela de qualquer cor - fará retornar o "brilho" nos olhos, do passado? A sensação de poder? A sultuosidade? Quando vejo um "velhinho" abandonado, lembro dos prédios que foram "esquecidos". Que histórias viveram? O que teriam para contar? Quem os substituirá? O tempo dirá...