sábado, 1 de janeiro de 2011

Nosso futuro incomum: descompromisso com o amanhã?


Colaborador Roberto Rocha

No outro dia, achei num sebo em Niterói (RJ), um livro que eu já tivera, - comprado na Fundação Getúlio Vargas - no Rio de Janeiro: Nosso Futuro Comum – Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1a  ed. 1988; 2a ed. 1991). O título original em inglês “Our Common Future” (1987) foi mantido, diferentemente do que costumamos ver com alguns filmes, em improvisações horríveis e pouco criativas. Embora a intenção tenha sido louvável, nós não alcançamos os resultados alardeados nos quatro cantos do mundo. O futuro continuou a ser uma incógnita num planeta globalizado e tocado pelo capitalismo desatento. Por questões de soberania, até entendo que não se pode “enfiar garganta abaixo” qualquer proposta, por mais interessante que aparente ser. Estão envolvidos nisso, interesses atuais, tradições seculares e crenças milenares. Resultado: não deu certo!. Pode realmente ter influenciado o pensamento de uns poucos, elitizados. O “povão”, como costumam tratar, continua correndo atrás do “dinheiro da passagem”, da “dívida no cartão”, do sonho de “uma casinha para morar”, de “não levar bronca do patrão” por ter chegado atrasado, se “ vai dar praia no final da semana”, “se o timão vai ser rebaixado” e tantas outras situações semelhantes. E então começam a aparecer diversas “terminologias estranhas” na televisão, nos jornais e revistas, do tipo: “Relatório Stern” (será sobre algum novo desfalque descoberto pelo Polícia Federal?); IPCC (será uma nova facção?); CEO (lugar onde vivem os anjos?); REDD (marca nova de roupa?); Objetivos do Milênio (nova novela das oito?); COP 15 (algum novo festival de bebida?): quem agüenta tanta sigla? A propósito: você - possivelmente uma pessoa “letrada” – sabe o que significa exatamente cada termo desses? Se sabe, parabéns! Se não sabe, prepare-se para os novos termos e siglas que certamente surgirão nos próximos anos. O fracasso da Convenção de Copenhague vai exigir muita imaginação para que cada país desenvolvido tente explicar por que não vai “co-operar”, isto é, por que vai continuar a “operar sozinho”, sem sacrificar as magras (?) economias que tocam ao seu disputado pedaço de bolo global. A preocupação maior é com os prejuízos previstos. A economia brasileira segundo o EMCB (você sabe o que é?) - disponível em: http://www.economiadoclima.org.br/ - corre o risco de perder, caso nada seja feito, a singela quantia de R$ 719 bilhões ou R$ 3,6 trilhões em 2050 (precisão é tudo!). Será que poderemos fazer revisões a cada cinco anos? As regiões mais afetadas serão o Nordeste e a Amazônia, conforme já apontaram alguns cientistas É claro que o calor, a seca e o excesso de água são fatores estressantes muito bem conhecidos e que derrubam qualquer planejamento para a agricultura. A geração de eletricidade também poderá sofrer defasagens. No entanto, acredito que será nessa área onde teremos mudanças positivas e que poderão contribuir para que as perdas não sejam tão intensas. O mais lamentável (?) mesmo, não será a perda das monoculturas e do gado, mas a perda da biodiversidade indígena (nativa) brasileira, ameaçada especialmente por mega-projetos que podem não atender exatamente às regras da natureza. Somos ainda muito ignorantes em conhecimentos básicos até mesmo sobre um só bioma! Imagine todos os biomas brasileiros funcionando e trocando energia e matéria, ao mesmo tempo? É uma verdadeira loucura!. Mas agora pense também que existem mudanças globais que podem afetar tudo isso ! Tenho um certo pavor quando falam de “adaptação” porque aprendi que esse fenômeno é muito lento. É preciso acreditar muito na engenharia genética como solução urgente para tais questões: e como fica o "princípio da precaução"?.  Outro sério problema será como organizar os deslocamentos de populações pressionadas pelas mudanças do clima: os refugiados ambientais. Mesmo que haja a possibilidade de que países “desenvolvidos” liberem tecnologia avançada para os países mais pobres, teremos que ter aqui um arsenal de “cérebros”. Precisamos estar prontos, esperando esses conhecimentos, capazes de compreendê-los e de aproveitá-los rapidamente, para não correr o risco de ficarem mais defasados ainda. Temos no país brilhantes grupos de cientistas que poderão ser mais incentivados a partir de novos recursos governamentais.Veja que não se trata de uma situação rotineira. É questão de crise de grandes proporções. Não poderemos estar errando em nossas previsões! Não haverá muito tempo para isso! Se as inundações do sul, continuarem a crescer – por culpa ou não do El Nino ou qualuqer outro motivo – as questões socioeconômicas poderão se agravar. Esperemos que seja somente um momento crítico que venha se normalizar logo. Como uma das medidas a serem tomadas, temos uma óbvia urgência: a de estancar o desmatamento da Amazônia. Deveríamos – ao mesmo tempo - investir maciçamente no reflorestamento de “áreas degradadas” e capacitação de comunidades, já pensando em alternativas de sobrevivência natural e menos dependente de monoculturas. Por exemplo, saber se é possível comer folhas de amoreira e de outras espécies florestais  – que cresçam rapidamente e cujos troncos “peguem de galho” sem precisar plantar sementes e ter que esperar mais ainda. Algo que uma comunidade ilhada possa obter como alimento (plantas aquáticas comestíveis?), sem depender tanto de estradas ou de aeronaves. Como purificar água, de modo seguro, para dessedentar as famílias isoladas em áreas elevadas? Durante enchentes, os animais da região também procuram as áreas mais altas; e isso pode gerar muitos problemas, especialmente doenças conhecidas como zoonoses, que passam de animais para o homem e vice-versa - a leptospirose que o diga!. Pessoas aglomeradas facilitam a passagem de virus, bactérias, protozoários  – de um indivíduo para outro - através de vetores (especialmente os insetos). A segurança alimentar também pode ficar comprometida: comer ratos não parece ser algo inviável numa situação crítica. O grande desafio que temos é que os sistemas naturais não seguem as regras econômicas humanas e, nesse momento, precisamos das duas. Já estamos nos preocupando com “mitigações” mas devemos também pensar em soluções mais “reais e palpáveis” que possam atender - mais rapidamente - uma enorme população de “pobres” porque eles certamente serão a maioria “em dificuldades”. Assisti ao filme 2012, no outro dia. Uma ingenuidade! Mas afinal, é ficção! E bota ficção nisso! Os “pobres” eram na verdade uma elite. Os que embarcaram eram mais especiais ainda. Os pobres “reais” nem apareceram! Eles são a maioria no mundo. Os animais da “arca” eram os que costumamos ver em jardins zoológicos: como se o mundo pudesse funcionar com essa ínfima amostragem!. Não percebi um destaque especial para salvar bactérias e fungos, indispensáveis decompositores na biosfera. Continuamos a entender o planeta constituído de individualidades e não de sistemas complexos. Quando olho para as estradas do país - e vejo os veículos circulando - lembro dos carreiros de formigas nas florestas, em suas correrias intermináveis. Elas se comunicam umas com as outras. Os veículos também obedecem a uma sinalização previamente conhecida. Mas quanta diferença nessas andanças! As formigas cortam as folhas das plantas doentes ou daquelas que elas já sabem que estão fragilizadas. Procuram então levar esse “alimento” para as suas "criações de fungos" e fazem reciclar o sistema com perfeição. Elas sabem que o que chamamos de árvore é apenas um momento provisório de matéria geneticamente programada. Que estão apenas transferindo o “ambiente” de um local para outro. Não possuem nenhuma preocupação - como nós humanos – com aspectos éticos de como tratar um moribundo ou um doente em apuros. No entanto, será que nós estamos, realmente, preocupados com a natureza? Nosso comportamento nesse caminho de muitos é compatível com uma solidariedade dita mundial? Estamos preocupados com o “outro”? Humano ou não? Essa pode ser uma reflexão necessária nesse momento de frustrações internacionais e de promessas vazias que enchem auditórios de personalidades. Pelo menos, o Brasil deixou um recado claro, mesmo sabendo das dificuldades que teremos para cumpri-lo. Foi o destaque da conferência no meio de tantos descompromissos. Nosso futuro só poderá ser comum num mundo onde a desigualdade não separe as pessoas de suas realizações e sonhos. Onde se respeite o ambiente tanto quanto o próprio homem, já que são uma coisa só. É dessa compreensão incomum que precisamos para o bem de todos, seja na forma de água, de planta, de animal, de gente ou qualquer uma outra...

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